I Congresso Estadual de Mulheres Catadoras de São Paulo fortalece a categoria e é parte da trajetória de Marineide Alves representante do setorial de reciclagem da Unisol Brasil.
Nos dias 01 e 02 de agosto deste ano aconteceu em Ourinhos, São Paulo, o congresso, que reuniu cerca de 230 mulheres de várias regiões do estado paulista, no campus das Faculdades Integradas de Ourinhos, teve o objetivo de articular e fortalecer as bases do movimento em todo o estado, por meio da luta das mulheres catadoras que atuam na Política Pública da Gestão dos Resíduos Sólidos, ao transmitir mais informações para catadoras de matérias recicláveis pertinentes às políticas públicas existentes dentro do Comitê Interministerial de Inclusão Social de Catadores de Materiais Recicláveis e apoiar as mulheres dentro dos projetos disponíveis.
Várias mulheres, representantes de diversos segmentos institucionais importantes para o movimento, participaram do encontro: a prefeita de Ourinhos, Belkis Fernandes, dando as boas vindas junto a Margarete Matos, promotora do Ministério Público do Trabalho, na mesa de abertura, acompanhadas das catadoras Maria Mônica da Silva, Guiomar Conceição dos Santos e Matilde Ramos da Silva, presentantes do MNCR; Daniela Metello, representante do Comitê Interministerial de Inclusão Social de Catadores de Materiais Recicláveis; Julia Silva, que representou Eleonora Menicucci da Secretaria Nacional de Política para as mulheres; Drª Margareth Mattos, Procuradora do Trabalho; a professora Ronalda Barreto, da UNEB; Helena Francisco da Silva e Maria Monica da Silva, lideranças catadoras das mulheres do MNCR, entre outras.
Durante as palestras, a representante da Secretaria de Políticas para a Mulher do Governo Federal, Maria Julia Martins, falou das políticas públicas e legislação voltada a proteção as mulheres e sugeriu a inclusão da Secretaria de Políticas para Mulheres no Comitê Interministerial de Inclusão Socioeconômica dos Catadores (CIISC). As catadoras da Comissão Nacional do MNCR, Marilza Aparecida Lima, do Paraná, e Madalena Duarte, de Minas Gerais, também prestigiaram o encontro.
O Congresso foi apoiado pela Unisol Brasil, por meio da presença de Marineide Alves, assessora técnica da entidade à frente do setorial de reciclagem e delegada neste evento, junto com União Nacional das Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária (Unicafes), Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Agricultura e Coordenadoria Ambiental de Ourinhos; e organizado pelo MNCR. Importante destacar que Ourinhos é o único município brasileiro mais avançado em termos de gestão de resíduos, sendo o primeiro a constituir um comitê municipal para discussão desta política, além de fundo financeiro para créditos para iniciativas de gestão.
O encontro contou com oficinas temáticas que discutiram sobre “Violência contra a mulher e juventude”, “Trabalho da mulher dentro das bases”, “Mulheres catadoras negras”, Mulheres e movimentos sociais”, “Troca de experiência regional”, “Sexualidade” e “Políticas públicas e demandas das catadoras”. Entre os resultados das oficinas estão a necessidade de discutir a desigualdade entre homens e mulheres nas cooperativas e associações de catadores, a elaboração de materiais pedagógicos sobre a Política Nacional de Resíduos Sólidos com fácil linguagem e a articulação direta com promotores públicos, responsáveis pela fiscalização da implementação das políticas de gestão de resíduos nos municípios.
No sábado dia 02, quando foi finalizado o evento, houve a eleição para compor as integrantes da Secretaria de Mulheres do Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis, integrada por 13 mulheres representantes dos Comitês Regionais do MNCR. Uma comissão executiva de seis catadoras também foi eleita pelos votos de 20 delegadas de cada Comitê Regional. O Congresso ainda aprovou a minuta de gerimento de funcionamento da Secretaria, que a cada dois anos deve realizar novas eleições.
Marineide Alves – Do lixo à luta
Trabalhando como empregada doméstica em 2005, Marineide Alves, 33 anos, viu o começo da implantação da coleta seletiva no condomínio em que prestava serviços, em Alphaville, bairro de classe alta do município de Barueri, a 35 km de São Paulo. Por conta desse projeto, os moradores e os profissionais que para eles trabalhavam foram convidados a participarem de palestras e workshops sobre a gestão de resíduos no bairro. Assim, à medida que Marineide foi adquirindo os conhecimentos em Alphaville, ela idealizou replicar a gestão de resíduos no bairro onde morava, que era uma favela, denominada ‘Morro do Socó’. Assim, entre 2005 e 2006, colocou em prática o ‘Projeto Bairro Limpo’. Hoje, a favela foi urbanizada e se transformou num bairro, o Colinas do Oeste, com 9.000 moradores e pertencente ao município de Osasco, que ao todo tem cerca de 700 mil habitantes.
O começo foi conversando com outras mulheres da região, quando Marineide montou uma associação ambiental de reciclagem, educação e inclusão social, a AAREIS. “Nos juntamos em 10 mulheres, vizinhas, e depois de dois anos de atividades da associação, chamamos a atenção da Prefeitura de São Paulo, que viu em nós o meio de realizar um projeto de construção de galpões de armazenamento e implantação da coleta seletiva no município de Osasco. Iniciamos os trabalhos por meio de um curso de dois anos, oferecido pela Prefeitura, sobre Economia Solidária e Cooperativismo e depois fomos convidadas e efetivadas para implantar o projeto, que envolvendo 40 pessoas, concluiu as instalações em um ano e meio e deu início à coleta seletiva”, salienta.
Assim, surgiu a Coopernatuz, onde Marineide, sócia-fundadora, fora presidente durante quatro anos, em seguida assumindo um ano como articuladora pública da cooperativa que hoje tem cerca de 35 cooperados, todos catadores. Findo o ciclo na Coopernatuz, Marineide deu continuidade na luta na Coopermundi, cooperativa que tem as mesmas funções da anterior e onde foi eleita tesoureira, à partir de setembro de 2014. “Agregamos cerca de 70 pessoas, onde desempregados e donas de casa encontraram um meio de subsistência”, enfatiza.
Entre outras ações nos últimos anos, Marineide recebeu em 2013 uma proposta do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) para a capacitação de 400 pessoas, onde permaneceu um ano. Recentemente, ficou quatro meses no interior de São Paulo para fazer um diagnóstico da questão de gestão de resíduos no sudoeste paulista, a convite da Unisol. Nas viagens, descobriu um lixão em Itapeva (SP), onde começou a desenvolver um trabalho de oficinas de capacitação e formação, junto com o Instituto Ecoar para a Cidadania (ECOAR) e a Unisol Brasil. Os frutos da iniciativa vieram e neste semestre, os catadores de Itapeva estão se formalizando como cooperativa. Em julho deste ano, assumiu a coordenação da reciclagem da Copa do Mundo na Funfest, promovida no Vale do Anhangabaú, centro de São Paulo, onde durante todo o período coletou-se cerca de mais 36 toneladas de lixo reutilizável, e Marineide geriu 130 catadores de cooperativas contratadas.
Perguntada sobre o que a levou a este mundo da reciclagem, ela ressalta: “Não vejo como um trabalho e sim como uma missão. Sou filha de carvoeira e perdi minha mãe aos nove anos; ela desenvolveu um câncer devido ao contato com o carvão, sem proteção. Embora minha mãe e minha família lutassem pela sobrevivência, eu conclui que agredimos a natureza, e isso volta pra gente. Assumi esta missão para compensar o que família fez contra o meio ambiente”, ressalta.
Marineide, que mora em Osasco e concluiu no ano passado o ensino médio, quer prestar ENEM e vestibular no ano que vem, para cursar uma faculdade de gestão de resíduos. Sobre a agenda até o final de 2014, ‘além de várias outras atividades’, Marineide tem pela frente a Conferência Nacional de Economia Solidária, em 26 de novembro, onde estará como delegada da Unisol durante os três dias do evento. Dezenas de catadores irão como delegados, representando municípios como Cotia, Osasco, Embu das Artes e cidades do ABC paulista, entre outros.
Para finalizar, ela faz uma breve reflexão sobre o nível de envolvimento da população brasileira com a reciclagem: “As pessoas estão abertas para a ideia, mas ainda não tem uma consciência ou não o fazem por princípio. Elas comentam que estão fazendo para me ajudar. Para combater isso, eu e meu grupo sempre fazemos um trabalho em conjunto de educação ambiental, mostrando que reciclar é cuidar da natureza e da vida na terra”, conclui, com esperança.
Fontes: Site da Easycoop, Site da Prefeitura de Ourinhos e MNCR.